quinta-feira, 12 de maio de 2011

NAVALHA NA ROSA (publicada na Revista Tatame n. 182)



Falar de mulheres sem ser brega ou piegas é quase tão difícil quanto comentar sobre MMA feminino e não parecer machista. De todas as coisas que uma mulher tem competência para fazer, trocar socos, chutes, joelhadas, estrangulamentos, com os lábios estufados por um protetor bucal, toda descabelada e ferida, não parece alguma coisa que devessem. Para mim não deveria haver MMA feminino e essa afirmação é tão verdadeira quanto o fato de que estou completamente equivocado. Mulheres são lindas para nossos olhos e sentidos de várias maneiras. São fisicamente mais frágeis, mais sensíveis, tomam conta de nossas fantasias desde muito jovens, são nosso young. São o que cobiçamos desde sempre, o motivo de quase tudo, sem as quais nunca seremos masculinamente completos. Isso tudo é lindo e não retiro nenhuma palavra, mas é uma percepção superficial. É um cheiro na relva sem saber até aonde vai a raiz.



Se admiro a beleza entranhada nas ranhuras da violência do esporte, porque não admirar a violência esportiva de quem poderia se contentar em ser apenas frágil? O martelo que poupa a rosa e a água que corta a rocha são igualmente admiráveis. Mais do que homens e mulheres, somos seres humanos. Esse é o núcleo. Prótons e nêutrons zunem dentro do mesmo átomo. Achar que mulheres não devem lutar apenas por serem o que são é estático, é como limitar uma raça pela cor ou hostilizar pela opção sexual. Se elas sabem que podem lutar MMA em alto nível que provem em sangue, ossos quebrados, músculos torcidos e impacto , sem dar moral para manifestos feministas e nem se intimidar com resmungo machista. A história do MMA começou e vai acabar dentro de um octagon e esse texto daqui de fora não pretende convencer ou provar nada. Esse texto é só uma carta de amor.


Não foram momentos históricos ou teorias sociológicas que fizeram a idéia de que mulheres devem lutar florescer no campo da minha certeza. Foi numa visita que fiz, no apagar momentâneo das luzes elétricas do cérebro, a meu coração. Fui consultar o oráculo e ele me lembrou das características da mulher que amo. Mulher para andar lado a lado, para me levantar se eu cair, me carregar se eu falhar. Fêmea que não quebra com qualquer impacto, não desiste, segue em frente, derruba mais do que é derrubada e sonha junto. È uma mulher poderosa e a única que já me apaixonou. E não há esporte com mais demonstrações de poder e paixão que MMA. Esse poder de ir além, superar, tencionar, agüentar, explodir, quebrar, remendar e continuar. A paixão pela glória, pelo fantástico, imprevisível, pelo próximo round. MMA feminino é um esporte para mulheres poderosas. Cris Cyborg e Gina Carano fizeram uma luta por cinturão digna do maior esporte do planeta. Afirmo que se tivesse ocorrido no UFC o debate sobre mulher nesse esporte estaria encerrado e teríamos no mínimo 3 categorias de peso.



Cris é olhada por muitos como a exceção que justifica a regra. A sua superioridade é tão magnífica que provaria ser impossível outras fazerem o mesmo. Pra mim é o oposto. Ela hoje é única, mas é o caminho evolutivo. È a prova de que dá pra fazer. È a primeira fagulha que estoura entre duas pedras. Dá para lutar em altíssimo nível. Ela não é uma lança para vazar o esporte, é o escudo que protege. Ela é um animal no octagon, rasgada, tensa, feroz, mais bicho que mulher. Mas essa é a natureza do esporte. Esse frenesi é que nos borbulha a adrenalina. Fora da luta ela é feminina, carinhosa e cordial. Sua brutalidade esportiva não dilui em nem um miligrama quem ela é como mulher. Ela é como é. Seu “eu te amo” para o marido ao fim das lutas é roteiro de cinema. Cris Cyborg faz poesia com os punhos fechados.


Dana White diz que não há mulheres talentosas o suficiente para abrir uma categoria de peso. Mais do que estar enganado, está mentindo. Já afirmou que Werdum era um lutador mediano, Fedor uma fraude, Overeem ser TOP 10 é coisa de ignorante, que o Strikeforce era um campeonato medíocre que só havia assistido 2 vezes na vida, mas acabou pagando R$ 40 milhões para tê-lo. MMA feminino só precisa de uma grande chance. Quando José Aldo estrear no UFC muitos que nunca viram graça em lutas abaixo do peso leve terão que baixar as cabeças frente a realidade explosiva do brasileiro. O mesmo vale para as mulheres. Cyborg X Carano, Cyborg X Jan Finney, Coenen X Carmouche são 3 exemplos de excelentes lutas que poderiam estar em qualquer card.


Meu amor é por MMA. A bela violência, a falta de frescura, a batalha constante por domínio, as técnicas, as estratégias, não pelo sexo do atleta. Mulher não sangra pétalas de rosa e é irrelevante se preferimos homens num combate, o fato é que elas oferecem tudo o que queremos ver quando assistimos a uma luta. Se for a Carano ou a Damm de shortinho oferecem até um pouco mais. O caminho para elas será bem mais difícil, terão que tombar adversários dentro e fora do octagon, lutar contra socos na cara e facadas invisíveis nas costas. A maioria vai tombar, é difícil agüentar. Mas que belas mulheres, apaixonantes e poderosas aquelas que conseguirem triunfar.

Por Nico Anfarri
Fonte: http://mmanapontadoqueixo.blogspot.com/

Nenhum comentário:

Postar um comentário